Comentários sobre o texto publicado na revista Carta Capital, edição especial, Ano XVII, nº 678, de autoria do professor livre-docente da Faculdade de Filosofia da USP, Vladimir Safatle.
À sombra da ditadura
“...Durante décadas, o País tudo fez para nada fazer no que se refere ao acerto de contas com os crimes contra a humanidade perpetrados pela ditadura. Isso o transformou em um pária do direito internacional, objeto de processos em cortes penais no exterior. Contrariamente a países como Argentina, Uruguai e Chile, o Brasil conseguiu a façanha de não julgar torturador algum, de continuar a ter desaparecidos políticos e de proteger aqueles que se serviram do aparato de Estado para sequestrar, estuprar, ocultar cadáveres e assassinar.
Nesse sentido, não é estranho que convivamos até hoje com um aparato policial que tortura mais do que se torturava na própria época da ditadura. Aparato completamente minado por milícias, grupos de extorsão e extermínio, assim como pela violência gratuita contra setores desfavorecidos da população. A brutalidade securitária continua a nos assombrar. Este é apenas um dos preços pagos por uma sociedade incapaz de dissociar-se dos crimes de seu passado recente.
Outro preço é o tema que mais assombra certos setores da classe média brasileira, a saber, a corrupção. Esquece-se muito facilmente como a ditadura foi um dos períodos de maior corrupção do Brasil. Basta lembrar-se de casos como Capemi, coroa-Brastel, Lutfalla, Baumgarten, Tucuruí, Banco Econômico, Transamazônica, Ponte Rio-Niterói, entre tantos outros. Eles demonstram a consolidação de um modus operandi na relação entre Estado e empresariado nacional que herdamos da ditadura.
Corrupção e violência policial são apenas dois aspectos do que restou da ditadura.....”
Chama atenção o texto porque seu autor, referindo a polícia, afirma que “ Minado por milícias e sem pagar por seu passado, o aparato policial tortura mais hoje do que no tempo dos militares.”
A frase ilustra a imagem de um policial militar com um fuzil: “Herança maldita. Até lá, casos como o do jornalista Baumgart e o policiamento agressivo de favelas serão temas comuns no Brasil.”
Enquanto os governantes mantiverem o aparato policial a seu serviço sem capacitá-los para servir aos cidadãos e a sociedade continuarão fazendo um desserviço à cidadania.
E os policiais enquanto se sentirem “autoridades” com direito de extrapolar os limites do poder concedido pelo Estado continuarão sendo resquícios da ditadura e mal vistos pela população.
"Não há nada mais insano do que fazer as coisas sempre da mesma maneira e esperar que os resultados sejam diferentes" ALBERT EINSTEIN