A injustiça no Brasil, em relação à população negra, não é só questão de classe, tal como foi pensado no passado, mas também de raça.

20 de Novembro de 2012

 "A igualdade de condições é uma categoria efetivamente expressa na legislação brasileira, mas que não representa a realidade fática do país. Promovê-la é o objetivo das políticas de ações afirmativas, ainda que estas “firam”, em princípio, a própria estrutura legal da “igualdade”. Afinal a igualdade é parte de um preceito intensamente disseminado no plano jurídico moderno, e reconhecido por todas as constituições modernas. A própria Constituição brasileira de 1988 ressalta em seu artigo 5º, caput: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (Constituição Federal, 2007). As ações afirmativas levam a uma reinterpretação deste dispositivo constitucional, considerando que os direitos materiais precisam ser implantados para se alcançar a pretensa igualdade, ou seja, de que a Carta deve ser interpretada no sentido de geração de igualdade, e não de um pressuposto falho de igualdade da qual a lei fala.
Esta mesma Carta Constitucional estabeleceu como crime o racismo, impedindo qualquer manifestação discriminatória na esfera racial (Art.5º, XLII – “A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”). O Estado tenta, assim, provocar um respeito a todas as diferenças raciais, pretendendo punir a sua infração. O Estado se dispõem, com isso, a garantir o reconhecimento das diferenças culturais, tal como aparece em Fraser, punindo o não-reconhecimento, mas o que por si só não impede que ele ocorra em tons subliminares dentro da sociedade.
A injustiça no Brasil, em relação à população negra, não é só questão de classe, tal como foi pensado no passado, mas também de raça. Como conseqüência, buscar justiça social no caso brasileiro não é só atuar através de medidas de redistribuição, mas exige algo além. Essas políticas, caso efetivamente tragam benefícios às populações segregadas, pode gerar redução do preconceito, levando através da redistribuição a um reconhecimento das diferenças raciais e uma aceitabilidade cultural a suas diferenças, ou seja, a um reconhecimento segundo a perspectiva de Fraser.
Nesse sentido, uma política eficaz e realista seria aquela que efetivamente conseguisse acabar com os efeitos de classe e conseguisse também acabar com todo tipo de preconceito e segregação em relação aos negros, independentemente da sua origem socioeconômica. Mas faço aqui, para terminar, uma observação: diria que as ações afirmativas são relativamente capazes de alcançar esse objetivo, pois a sua direção está muito mais focada em redistribuição - esperando que a partir daí resolvam-se os problemas de reconhecimento - do que propriamente ela ataca diretamente o problema do reconhecimento das diferenças culturais."

Excerto do artigo de Wallace Ferreira, publicado na revista eletrônica Jus navegandi 11/12.


 
 
A foto oficial do governo brasileiro comprova a necessidade de muitas ações afirmativas a serem realizadas.  No inicio do atual governo posaram para a fotografia oficial 38 ministros e secretários.
Apenas dois eram negros.
Aos cidadãos brasileiros não existe melhor exemplo do que o governamental.
A imagem permite concluir sua orientação: "façam o que eu digo (respeitem as diferenças)  mas não façam o que eu faço (deixando-os fora do núcleo de decisão)."
 
 
E ai?
 
"Uma das tentativas mais concretas empreendidas pelo governo federal em direção à aplicação de medidas de ações afirmativas, foram as portarias estabelecendo medidas inclusivas nos quadros administrativos do governo federal. Dentre elas encontram-se as que se referem ao Ministério da Justiça e ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, ainda no governo FHC. No Ministério da Justiça, uma portaria instituiu um programa de ação afirmativa que propunha o preenchimento até o final de 2002 de cargos de direção e assessoramento superior, considerando uma proporcionalidade de 45% das vagas para grupos socialmente excluídos (20% para afro-descendentes, 20% para mulheres, e 5% para portadores de deficiência). Já no Ministério do Desenvolvimento Agrário, decretou-se uma portaria indicando que, a partir de agosto de 2002, as contratações ou a continuação de serviços MDA/ INCRA seriam feitos considerando comprovações de ‘desenvolvimento de ações de cunho social/ afirmativo, de resgate da cidadania, respeitando a diversidade – raça/ gênero – em seus quadros funcionais’ , do mesmo modo que os editais  de contratação incluiriam a necessária apresentação de propostas, por parte das empresas licitantes, de ações afirmativas. (Vieira, 2005)."