O Brasil sofre muito mais com o álcool e o tabaco do que com a maconha e outras drogas.

No Brasil, assim como nas demais partes do mundo, a guerra às drogas está perdida há muito tempo. Existe, porém, interesses econômicos que induzem as pessoas acreditar que a repressão policial dispõe de soluções para reduzir ou acabar com o tráfico de drogas.
 
A hipocrisia social que abate a sociedade tolera que o álcool e o tabaco sejam drogas aceitáveis mesmo quando sabe que milhares de pessoas morrem em decorrência do seu uso excessivo, assim como em acidentes e brigas motivados pelo seu consumo em demasia.
 
O Brasil sofre muito mais com o álcool e o tabaco do que com a maconha e outras drogas.
 
As polícias brasileiras, principalmente as estaduais, consomem seus servidores aprendendo "trouxinhas" como se estivessem combatendo o tráfico de drogas. Prendendo usuários como traficantes e distantes dos grandes cartéis que continuam impunes, transacionando drogas e armas para a manutenção de um grande sistema de distribuição que vitimiza jovens em confrontos com a polícia.
 
As autoridades de saúde pública jogam o problema para a polícia que "combate" pequenos "vapozeiros", enchendo as cadeias e não reduzindo a violência e a criminalidade.  
 
Este é o motivo pelo qual é necessário discutir novos caminhos para enfrentar o uso de drogas ilícitas sob pena de, daqui a dez, vinte ou trinta anos, o País continuar na mesma situação.   
 
 
 A notícia
 
Guerra às drogas” começa a mudar de rota
"O ano de 2012 pode ser considerado o ano em que a “guerra americana contra as drogas”, declarada em 1971, por Richard Nixon, mudou de rota. Sete acontecimentos merecem destaque. 2012 já pode ser considerado o ano em que a “guerra americana contra as drogas”, declarada em 1971, por Richard Nixon, mudou de rota.
 
 
Sete acontecimentos merecem destaque: (a) a legalização da maconha em dois estados norte-americanos (Washington e Colorado); (b) os pronunciamentos do presidente Barak Obama; (c) a posse do novo presidente do México que promete alterar a política precedente necro-repressiva; (d) a proposta de legalização da maconha no Uruguai; (e) o novo plano nacional de drogas dos EUA que enfoca o usuário como não criminoso; (f) a recomendação da Comissão de Política para Drogas do Reino Unido para adotar a política de drogas de Portugal e (g) a posição do presidente da Guatemala (em favor da liberação das drogas).
 
 
Todas essas mudanças, vistas isoladamente, podem não ter muito significado, mas enfocadas em conjunto podem estar sinalizando um futuro completamente diferente do que vem preponderando desde a década de 70. Atenção especial merecem as duas primeiras mudanças.
 
 
No dia 16.11.12 passou a valer a legalização da maconha no Estado norte-americano de Washington (para fim recreativo). Desde o dia 05.01.13 a mesma legalização vale para Colorado. Em ambos os estados será permitida a posse de até 28,5 gramas de maconha para maiores de 21 anos. O consumo público será punido com multa (US$ 100).
 
 
É a primeira vez que os norte-americanos legalizam a posse e o consumo, bem como a produção e o comércio da maconha (vitória, aliás, com boa margem de votos). Oregon recentemente e a Califórnia anteriormente rejeitaram semelhante proposta. O uso terapêutico (medicinal) já está adotado em 18 estados norte-americanos (17 Estados mais o distrito de Washington). Nas eleições presidenciais de 06.11.12 o Estado de Massachusetts também aprovou o uso medicinal.
 
 
No plano federal a posse de maconha para uso pessoal continua proibida e punida com prisão. Nos dois estados citados está adotada a legalização. Barak Obama disse que a perseguição de usuários de drogas nesses estados não é política prioritária do seu governo. Em dezembro de 2012 o instituto Public Policy Polling divulgou pesquisa nacional em que 58% dos americanos acreditam que o uso de maconha deveria ser liberado em nível federal (Folha de S. Paulo de 07.12.12, p. A21). Em 2011, o Gallup mostrava 50% favorável, contra 46% contrário. “Os eleitores falaram e nós precisamos respeitar sua vontade”, disse o governador do Colorado.
 
 
A primeira lei local que liberou a maconha para uso medicinal é de 1996. De lá para cá, 21 dos 50 Estados norte-americanos já promoveram algum tipo de afrouxamento legislativo. Isso não teria ocorrido se a única via da mudança fosse alterar a norma federal (H. Schwartsman em Folha de S. Paulo de 11.11.12, p. A2).
 
 
Em uma entrevista para Barbara Walters, dia 14.12.12, o presidente Obama disse (conforme síntese de Jorge G. Castañeda, em El País de 31.12.12, p. 22): (a) que a aplicação da lei federal proibitiva das drogas nos Estados de Colorado e Washington não é uma prioridade do seu governo (melhor é perseguir os “peixes gordos”; (b) que é contra a legalização das drogas, “neste momento” (é o primeiro presidente que sinaliza mudanças nessa política para o futuro); (c) o país inteiro deve manter um diálogo nacional sobre a disjuntiva entre a legalização estadual e a lei federal sobre drogas.
 
 
No âmbito da América Latina, a surpresa ficou por conta do Uruguai (de Mujica), que está pretendendo (desde agosto de 2012) ser o primeiro país a legalizar a maconha no nosso entorno cultural. Atualmente o consumo de drogas já está descriminalizado no país. A droga, no entanto, continua proibida. Houve recuo do presidente Mujica, logo após a divulgação de uma pesquisa em que a maioria se mostrou contra a legalização. Os parlamentares dizem, no entanto, que o projeto terá prosseguimento (em 2013), mas não será fácil vencer a resistência norte-americana. Até mesmo a oposição acha boa a ideia de clubes de cultivo (não a liberalização geral, sim, clubes privados de cultivo, tal como os existentes na Espanha).
 
 
Os defensores da política da guerra repressiva, sobretudo ao usuário, estão perdendo várias batalhas. Cada vez mais contam com ferrenhos opositores, no mundo todo (na Europa, sobretudo), que estão adotando políticas alternativas, levando o usuário para o campo da saúde pública e/ou privada. A droga continua proibida, mas o usuário deixa de ser um problema de polícia e da Justiça criminal.
 
 
A Holanda (que é pioneira na política de tolerância com as drogas leves, desde os anos 70) não pode servir de apoio aos repressivistas porque ela não fechou, em 2012, os “cafés” (“coffee shops”) especializados na venda de drogas leves, sim, apenas proibiu que sejam frequentados por pessoas não residentes no país (pretende, com isso, evitar o turismo das drogas).
 
 
Não se pode ter a ilusão de que a política repressiva norte-americana vá desaparecer de uma hora para outra. Porém, como disse Castañeda (El País de 31.12.12, p. 22), “depois de vários decênios de repressão, sangue e criminalização, as coisas começam a mudar [sobretudo nos EUA e na América Latina]. Que lástima que demoraram tanto”.  - Elaborado em 01/2013.