O debate sobre a necessidade de mudanças na segurança pública do país acontece a partir da movimentação, inicialmente tímida, de organizações não governamentais brasileiras de direitos humanos. Muitas vezes incentivadas por organizações internacionais, reagem a manutenção de práticas originárias no regime militar, onde eram ignorados os direitos de qualquer cidadão e onde a violência e arbitrariedade policial era regra. Mesmo não admitindo que essas condutas continuaram a ser empregadas, viu-se o Estado brasileiro obrigado a incluir na formação dos servidores de segurança pública a garantia dos direitos dos cidadãos, mesmo quando presos.
A violência policial foi reduzida consideravelmente, mas não o suficiente, pois até hoje assistimos cenas nos noticiários que mostram excessos e abusos nessa atuação. A violência policial caracterizada por execuções, torturas e ferimentos decorrentes do uso excessivo da força, além de extorsões, prisões indevidas, interrogatórios mal conduzidos, buscas e apreensões ilegais. Tudo isso agravado pela inexistência de políticas públicas que melhorem a vida da maioria da população que necessita do serviço público.
A falta de convicção sobre o fundamento para que haja o respeito aos direitos dos cidadãos não é só dos policiais, mas também dos governantes. A Secretaria Nacional de Segurança Pública, responsável pela indução da política de segurança para as Unidades Federadas, em seu relatório do “Curso Nacional de Multiplicador de Polícia Comunitária”, (2007, p.21 a 24), afirma que:
”... na atualidade o tema direitos humanos vem merecendo especial atenção em razão de haver taxativa desaprovação da opinião pública internacional aos países onde se observa o desrespeito às convenções e tratados que regulam os aludido direitos (sic). Este fato – ligado ao impacto que as cenas de violência causam aos espectadores em geral – despertam um interesse especial às redes de televisão em transmiti-las (em razão, principalmente, da audiência) e quando isto ocorre surgem pressões de organismos internacionais contra aquela situação, refletindo indireta ou diretamente sobre a Polícia Militar”.
O argumento usado para a aplicação da prática de respeito aos direitos humanos dos cidadãos é inaceitável. Não se fundamentará o respeito aos direitos das pessoas em decorrência da pressão de organizações internacionais ou pela possibilidade de que essas ações venham a ser publicizadas. O Estado não demonstra ter poder para enfrentar as más práticas rotineiras da polícia brasileira. Na dúvida, os excessos são tolerados e poucos são punidos. Caso sejam flagrados é acionado o sistema de autodefesa corporativa, tribunais militares e sindicâncias internas burocratizadas, que se encarregam de burlar ou procrastinar a Lei.
A “Construção de um novo paradigma de segurança política é a base para uma justa política de Direitos Humanos se desenvolver”. Segundo Tarso Genro, “a agenda dos Direitos Humanos é tanto uma questão local, nacional como uma questão global, porque ela é a própria cultura democrática da modernidade em ação. Mas, para que a agenda de Direitos Humanos possa ser tomada seriamente em termos globais, é necessário consagrá-la através de acordos civilizatórios entre nações, combinados com os compromissos de segurança política interna que se sustente no seguinte tripé: segurança jurídica, segurança econômica e segurança pública.” (Site do Ministério da Justiça, consultado em maio de 2009).
São grandes as dificuldades que os gestores públicos encontram para sustentar qualquer política pública na área de segurança enfrentando situações sobre as quais não tem o necessário controle. A proposta de mudança estrutural exige uma nova mentalidade do servidor que faz a gestão das corporações policiais. Não se trata aqui de optar por novos equipamentos. Trata-se de mudar a formação dos operadores para que atuem de maneira mais civilizada como servidores de um verdadeiro estado democrático.